segunda-feira, 28 de junho de 2010

Economia e ambiente

Estive, há dias, no Museu da Electricidade, onde assisti à conferência, promovida pelo “Sol”, sobre “Economia, Ambiente e Sustentabilidade”. O que me levou lá foi o meu interesse em ouvir o professor Ernâni Lopes. E valeu a pena, pois assisti a uma lição magistral. E não foi com a sua dissertação sobre economia que o professor mais me impressionou. Acima de tudo foi a atitude de uma pessoa sábia e humilde que questionou o “direito” do homem destruir o ambiente, pois que o “poder” adquiriu-o ele já há bastante tempo: primeiro, com o “clarão” de Hiroshima, em 1945, e, depois, com a descoberta do ADN, em 1960. No primeiro momento tornou-se evidente o poder da destruição cega e massiva, e no segundo a capacidade de manipular geneticamente o genoma dos seres vivos.

Falou o professor do capitalismo, que diz ter “nascido” em 1776, no ano da publicação da "Riqueza das Nações" de Adam Smith, e que foi também o ano da independência da América. Capitalismo cujo desenvolvimento foi alimentado pela primeira revolução industrial, e que foi causa e efeito de inúmeras conquistas tecnológicas (daí poder chamar-se-lhe uma revolução!). Mas, acrescenta ele, conseguidas à custa da contínua e progressiva destruição do ambiente. Assistimos agora a um ponto de viragem, pois já nos demos conta que o ambiente não pode mais ser mais destruído, antes pelo contrário, precisamos de o reconstruir, e de recuperar os estragos. E essa reconstrução, para o conferencista, abre uma nova e grande oportunidade ao capitalismo. Porque ele acha que o capitalismo sempre foi capaz de dar “a volta por cima” às dificuldades, e até foi capaz de transformar derrotas em vitórias, e falhanços em novas oportunidades.

Eu tendo a discordar desta conclusão, e disse-lho no curto debate que seguiu. Como poderá o capitalismo passar de destruidor a protector? Poderá o lobo, devorador de cordeiros, transformar-se, como que por encanto, no seu criador e protector? A destruição do ambiente pelo capitalismo, é, na minha opinião, a afirmação do seu “instinto” predador, a forma de garantir a sua sobrevivência. Afinal consumir é, na nossa economia capitalista e liberal, sinónimo de destruir.

Ernâni Lopes acredita que a tecnologia (para ele o grande trunfo do capital) pode mudar o mundo, e pode até resolver o problema energético. Chegou mesmo a afirmar que a “economia” encontrará, quando for necessário, um substituto para o petróleo. E, quando se falou de “colapso”, ele acusou o toque, e confessou que conhecia os casos enunciados por Jared Diamond no seu famoso livro, com aquele nome, e recentemente traduzido para português. Mas que discordava do autor sobre as razões dos vários exemplos de “colapso” apresentados no livro (incluindo o famoso exemplo da Ilha da Páscoa), e que, achava ele, a verdadeira causa tinha sido a incapacidade dos intervenientes para encontrar soluções tecnológicas para os resolver. Aqui o que me separa do conferencista são os princípios da termodinâmica: a tecnologia não cria energia, aliás, a energia não se cria (1º principio). Só se transforma, e mesmo a transformação nunca é gratuita (2º principio).

Mas este pormenores não retiram nada ao essencial da conferência nem reduzem o seu interesse. Ernâni Lopes explanou conceitos que nos fazem pensar, tais como a diferença entre política, doutrina e ideologia; disse-nos que na escala do nosso relacionamento com o mundo (o weltanshaung), a sabedoria, sobrepõe-se ao conhecimento, o qual por sua vez se sobrepõe à informação, e aos dados. Nas sua dissertação revelou-se um sábio, descomprometido e humano, e demonstrou possuir uma grande inteligência. E assumiu, com humildade, uma atitude quase religiosa perante o mundo e perante a vida.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Obama e a Energia

O discurso que Obama proferiu, na Sala Oval, no passado dia 15 de Junho, a propósito do desastre ambiental da BP no Golfo do México, faz lembrar os discursos de Carter em 1977. Discursos aqueles proferidos entre os dois primeiros choques petrolíferos, época em que as questões de energia estavam, tal como hoje, na ordem do dia. Carter estava plenamente consciente da frágil situação energética americana, alertou para ela, quis resolvê-la. Mas não teve sucesso, e acabou por nem sequer ser eleito para um segundo mandato.

Reagan, que veio a seguir, beneficiou, a partir de 1980, duma conjuntura bastante favorável, que veio aliviar a difícil situação energética do mundo. Foi o caso da redução do consumo de petróleo, do início da entrada em funcionamento de inúmeras centrais nucleares, do contributo de novas bacias petrolíferas, no Mar do Norte, no Alasca, no Golfo do México. E não se pode esquecer que foi a partir de 1980 que o gás natural veio ocupar o lugar do petróleo nas centrais termoeléctricas. Tudo isto contribuiu para fazer baixar fortemente o preço do crude nos 25 anos seguintes, e criar a ilusão de que tudo tinha voltado ao “normal”.

Obama está agora confrontado com uma situação semelhante à da época de Carter, e vem repetir o mesmo tipo de discurso. Mas agora num contexto que se apresenta com perspectivas bastante menos promissoras. Já não existem as alternativas surgidas em 1977, o nuclear já não se mostra esperançoso, a produção de crude estagnou, e não existem novas áreas a explorar para compensar as quebras de produção. A "solução" que agora se apresenta é a revolução "verde" apoiada no desenvolvimento das energias renováveis. Com perspectivas, custos e eficácia ainda mal conhecidos.

No seu discurso, Obama, lembra a actual situação energética da América, e o paradoxo que ela representa. Diz ele: ”O petróleo é um recurso finito; consumimos, no nosso país, mais de 20% do petróleo extraído a nível mundial e temos menos de 2% das reservas”. E põe, de forma desassombrada, o dedo na ferida : “Durante décadas percebemos que os dias do petróleo fácil e barato estavam contados, e falámos da urgente necessidade de escapar à nossa dependência dos combustíveis fósseis. Mas falhámos nesse propósito, e não fomos capazes de actuar com a urgência que se impunha. E não foi apenas pela acção dos "lobbies" petrolíferos, mas foi também pela nossa falta de coragem política e pela falta de franqueza em enfrentar o problema”.

Obama acrescenta que “chegou a hora de fazer a transição para uma era de energia limpa. Sabemos que isso tem custos, mas que temos de enfrentá-los agora”. Mas parece desorientado sobre as acções a tomar, parece não saber o que fazer e espera por soluções: ”Existem muitas ideias, e espero vê-las pôr em prática para resolver o problema. O que não podemos é ficar parados”. Faz um apelo à fé na América: “Se nós fomos capazes de produzir tanques e aviões na Segunda Grande Guerra, e colocámos um homem na Lua, teremos de ser capazes de enfrentar e resolver também o presente desafio”. E conclui invocando a Deus: “Esta não é, certamente, a última crise que América terá de enfrentar. Rezo por dias melhores”.

Desde que Dick Cheney, quando confrontado com a necessidade de alterar os hábitos de consumo americano, exprimiu a opinião de que o “american way of life” é inegociável, que a maioria dos americanos entraram numa espiral de cegueira colectiva da qual só sairão perante algum choque imprevisível, e certamente muito doloroso.
Os ventos não correm de feição para a manutenção do “american way of life” E, tal como Carter, Obama corre o risco de não ser eleito para o segundo mandato.