segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Petróleo: Ótimismo Perigoso

O relatório que a Agência Internacional de Energia (AIE) publica anualmente, no mês de novembro, é um documento essencial para entender a situação energética no mundo, e em particular aquela que diz respeito ao petróleo, a forma de energia fóssil mais sensível para a saúde da economia. Recorde-se que a AIE é o organismo, sededado em Paris, que presta serviço de vigilância energética para os países da OCDE, e providencia a criação de stocks de crude em situações de emergência.

O relatório de novembro passado é apresentado, como habitualmente, com otimismo, apesar das reservas que no anos recentes se podem ler nas entrelinhas dos referidos relatórios. Uma das paricularidades destes WEO´s (World Energy Outlook) é a de apresentarem  previsões de produção e consumo sempre crescentes.

No relatório de 2012, apresentado  à imprensa no mês passado, expressa-se um cenário caraterizado pelas seguintes tendências: a produção de petróleo convencional (o velho crude que brota no estado líquido das jazidas!) continuará estabilizada e suportada pelo previsível aumento da produção no Iraque; haverá forte incremento da produção de crude não convencional a partir das areias betuminosas (tar sands) do Canadá e das  rochas xistosas (oil shale ou tight oil) dos Estados Unidos; valoriza-se ainda o aumento da produção de petróleo de águas profundas, e o ganho que se consegue nas refinarias (onde um litro na entrada se converte em um litro e "pico" na saida). Embalado por estas previsões otimistas o relatório já admite que os Estados Unidos podem voltar a ser o maior país produtor mundial a partir de 2020!

Oa analistas que se debruçam sobre estes dados têm sido unânimes em criticar o otimismo deste relatório apontando os riscos de possíveis ocorrências de alguns percalços. O Iraque, que foi invadido pelos EU há quase 10 anos, tarda em recuperar a produção, mantendo-se nos 2,5 a 3 milhões de barris por dia, muito longe dos  10 milhões previsíveis para daqui a 10 anos. Os problemas de segurança e alguns problemas técnicos como a escassez de água salgada necessária para injetar pressão nas jazidas que estão muito mais afastadas do mar do que as da Arábia Saudita (como é o caso da jazida gigante de Gawhar).

A produção a partir das tar sands no Canadá, feita por mineração ou por injeção profunda, constitui um verdadeiro problema ambiental que está a destruir toda a região de Atabasca na província de Alberta. Máquinas gigantescas extraem as areias que são depois lavadas com água quente (aquecida com gás natural) que arrasta o crude. Esta forma de extração não só tem elevados custos ambientais e energéticos (há quem diga que se gasta 1 barril de petróleo para produzir dois!), mas só se justifica com os elevados preços da matéria prima nas bolsas de mercadorias. O mesmo se pode dizer da produção das rochas de xisto americanas na região de Bakken no Dakota do Norte que é feita pelo processo de fraturaçao hidráulica e que é responsável pela contaminação de aquíferos.

Mas o que mais preocupa os que se ocupam de assegurar o suficiente fluxo energético de petróleo na economia, é a imparável tendência de aumento de consumo nos países emergentes, sobretudo na China e na Índia. Como única forma de conciliar este aumento de consumos nestes países com a escassez de produção, leva a AIE a prever uma forte diminuição de consumo nos países da OCDE que poderá ser de menos de 5 milhões de barris/dia em 2020 comparada com o consumo atual. Ora isto, a acontecer, implica que a retoma económica nestes países ( e o pleno emprego!) será uma ilusão!

O petróleo é o sangue da economia e o recurso mais importante para estimular e sustentar o crescimento que é tão necessário e tão desejado. O otimismo da AIE justifica-se para manter as expetativas a um nível elevado e evitar sentimentos depressivos nos agentes dos mercados.  Mas que não existam ilusões: o petróleo é um recurso finito cuja produção vai recorrer a tecnologias cada vez mais sofisticadas que terá custos ambientais e de exploração crescentes. A sua escassez é talvez o maior problema que a economia mundial vai enfrentar nos anos futuros. O otimismo do recente relatório da AIE serviu para animar a economia, mas é uma cortina de fumo que esconde a verdadeira dimensão do problema, e que, no limite, só servirá apara adiar o confronto com o inevitável cliff energético.

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