segunda-feira, 27 de maio de 2013

O Lugar da Europa

De vez em quando, o Filósofo de Vence desce ao povoado e vem iluminar com o brilho das  suas ideias e com a nitidez do seu discurso a nossa tristonha obscuridade. Desta vez, numa entrevista ao Público, ajudou-nos a perceber a teia em que a Europa se encontra enredada. Mostrou-nos a lógica dos acontecimentos, e com a sua habitual clarividência, antecipou a História. Disse-nos o óbvio: que a Europa já não é o centro do Mundo, que está desesperadamente à procura de reencontrar esse lugar perdido, que ainda não se conformou com essa perda; que acabou a Europa das nações, mas mantém-se a mentalidade das nações, e que desfeitas as partes ainda não se reconstruiu o todo. Falou dos protagonistas, de Merkl, de Hollande e de Sarkozy, falou da Globalização, e concluiu que a Europa reincarnou na América, mas que a América não é a Europa e não a substituiu. Falou do fim das guerras e das guerras sem fim. Ele, como ninguém,  tem seguro o fio da história, e pode, com essa segurança, anunciar-nos o fim de um ciclo europeu.

Eduardo Lourenço é um observador atento, e tem uma cultura soberana. Ele é um ativo da nação, e mantém aos 90 anos uma lucidez que nos espanta e, ao mesmo tempo, nos conforta. No passado dia 20 de maio, ao fim do dia, no Centro Nacional de Cultura, a propósito da reedição do livro "Os Militares e o Poder", falou-nos, mais uma vez, de Portugal de do seu destino. Centrou a sua análise na reconversão da Pátria que se operou com o 25 de Abril, em que Portugal se despiu das suas colónias que lhe davam sentido e até razão de ser. Depois disso, Portugal não mais seria o mesmo, e não mais será o mesmo. Com a língua como único património diferenciador, este é um país do faz de conta. Resta-nos a nostalgia de um Camões do Império sonhado, e de um Pessoa angustiado e angustiante  na eterna procura dos retalhos desse sonho desfeito.

A verdade é que o mundo vive hoje numa encruzilhada e a Europa também.  Lourenço, o magnífico, talvez tenha em seu poder um novelo de Ariadne que sirva para nos guiar para a encontrar o caminho para a saída crise, ou talvez já tenha intuido que não conduzirá a nenhuma saída, porque o labirinto não tem saída.  Porque ele faz o diagnóstico mas não arrisca mais do que isso. Deixa  para nós o prognóstico, como se nos convidasse a adivinharmos o que está do outro lado da crise. Mas foi ele mesmo que um dia nos disse que esta crise não tem "outro lado".

A Europa não tem gente, não tem indústria não tem energia.  Tem a cultura, mas de que lhe vale a cultura?  O simples custo de a preservar pode ser demasiado elevado. Tem um serviço social sem paralelo no mundo, mas que, sabe, não poderá manter. Está empenhada em reduzir a poluição, em aumentar a eficiência energética,  e aposta nas energias renováveis.  Mas nesta cruzada, a Europa faz o papel do cavaleiro da triste figura, esgrimindo com lanças contra moinhos de vento, quando a Coreia do Norte aponta armas nucleares ao Ocidente, e a China polui em quatro meses o que a Europa, esforçadamente, deixa de poluir  em 10 anos! Mas o maior perigo para a Europa são as hostes de famélicos que se perfilam e espreitam nas suas fronteiras preparados para abocanhar a presa, ou o que dela restar, ao mais pequeno descuido.

A Europa já não lidera o Mundo, mas quem o lidera? A América, afogada nas sua responsabilidades de guardião da ordem global, que tem de manter um exército longe do seu território, e faz lembrar o decadente  Império Romano dos séculos e III e IV? A China que carrega o peso de uma civilização milenar, e tem de gerir as contradições  entre a sua cultura e o modelo económico que o Ocidente lhe impôs? A Rússia que perdeu o seu tempo e o seu espaço, e que hesita entre aliar-se à China ou à Europa? Todos estes protagonistas sabem que a resposta ainda não é definitiva, mas todos eles pressentem que o futuro do mundo se joga no Médio Oriente,  no eixo que vai de Israel  ao Paquistão.

No próximo dia 6 de junho, Eduardo Lourenço estará na Guarda para falar de Portugal e do seu destino. Desta vez, terá a vida facilitada pois já tirou a conclusão: o destino de Portugal é o destino da Europa.

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