segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O bosão de Higgs

Um amigo meu perguntou-me, há dias, se após a descoberta do bosão de Higgs ainda precisamos de Deus para explicar a criação do Mundo. O bosão de Higgs é uma partícula subatómica conhecida pela partícula de Deus. Por ser altamente instável e desprovida de spin e de carga elétrica, teimava em escapar aos detetores que analisam a desintegração dos núcleos quando bombardeados por protões nos aceleradores eletromagnéticos do CERN (Conselho Europeu de Pesquisa Nuclear, na Suiça). Finalmente foi detetado, e isso veio contribuir para confirmar algumas teorias  relacionadas com a estrutura do núcleo do átomos.

No tempo em que eu estudei Física na Universidade, a estrutura do átomo  ainda era descrita na forma simples de um núcleo a volta do qual giravam eletrões, em órbitas bem definidas, à semelhança de um sistema solar em miniatuira. As dimensões do átomo eram desconcertantes pois mostravam que, dentro deles, predominava o espaço vazio. Imaginem, por simples comparação a uma escala humana, que o núcleo tem o tamanho de uma laranja, e os eletrões giram em órbitas com  vários quilómetros de raio!

Julgava eu que a questão estava arrumada. O modelo parecia definitivo e extraordinário. A última camada eletrónicas à volta do núcleo tinha um númeo de eletrões entre 1 e 8 e isso explicava a formação dos iões e dos compostos químicos. Por exemplo, todos os elementos com um eletrão na última camada são quimicamente parecidos entre si. Assim se construiu a elegante a tabela de Mendeleev, onde se arrumavam e explicavam as propriedades de  todos os elementos da natureza. 

Mas, nos últimos 50 anos, aprofundou-se o estudo do átomo e começou-se a desvendar  a natureza das suas partículas subatómicas. O eletrão passou a ser visto como tendo um natureza mista de onda e partícula e as suas propriedades eram melhor explicadas pelas leis de distribuição estatística do que pela física absolutista de Newton. A mecânica clássica dava lugar à mecânica quântica. A Física das coisas e das certezas dava lugar à Física dos conceitos e das probabilidades.

O núcleo do átomo, onde se concentrava a sua massa e onde as suas componentes (o protão e o neutrão) estavam fortemente unidos, revelou-se uma caixa de surpresas. Decompor as partículas do núcleo em outras componentes elementares vinha resolver alguns problemas e consolidar uma teoria explicativa que ficou conhecida pelo modelo padrão. Primeiro surgiram os quarks, aos quais se associaram novas e estranhas propriedades como o spin. Depois os leptões, os fotões, os bosões e os fermiões, alguns deles servindo para explicar as forças de atração entre partículas nucleares.

O bosão de Higgs é uma peça que faltava no puzzle que os cientistas tentam montar para perceber  natureza última da matéria. Ele vem explicar a massa de certas partículas. Mas o puzzle continua incompleto. Procura-se agora uma outra partícula, que já tem nome, o gravitão, um fermião  que se julga responsavel pela força da gravidade, essa força misteriosa que faz com que dois corpos afastados e isolados um do outro se atraiam mutuamente.  Ainda ninguém conseguiu explicar a misteriosa gravidade. É como se entre dois corpos materiais existisse uma invisivel "paixão" que os impele um para o outro. E, quando o átomo estiver explicado, já teremos percebido 5% do Universo! A seguir, será altura dos cientistas partirem  à procura da matéria negra que ajudará a explicar mais uma parte dos restantes 95%.

Ao meu amigo que me colocou a intrigante pergunta sobre se Deus ainda é necessário para explicar a criação do Mundo, eu sugeri-lhe que contasse as estrelas do Céu que são mais do que os grãos de areia da Terra, ou que contasse os átomos de carbono dum ponto, deixado impresso pela grafite de um lápis afiado, numa folha de papel, e que são mais que pessoas existentes à face do nosso planeta! Quando terminasse a contagem, eu responderia à sua pergunta, caso ele ainda precisasse da resposta.

1 comentário:

  1. Excelente texto.
    Para um curioso do assunto, como eu, é facil ter algumas noções da física, lendo este texto tão simples na forma como é escrito.

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