segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Stress Hídrico

Entre os recursos naturais ameaçados pela Sociedade Industrial e pela Globalização, a água é um dos mais sensíveis. Sem água potável a vida das espécies animais e vegetais e, em particular, a dos humanos ficará seriamente ameaçada. O uso doméstico, a indústria, a agricultura e a pecuária reclamam quantidades cada vez maiores de água. As alterações climáticas favorecem a ocorrência de fenómenos extremos de seca e de inundações, fenómenos esses que agravam o problema. A escassez de água afeta já grandes massas populacionais em muitas zonas do planeta. Se não forem tomadas medidas adequadas, a humanidade, num futuro não muito longínquo, poderá enfrentar graves problemas no abastecimento de água potável .

São bem conhecidas secas cíclicas no nordeste do Brasil. Mas, pela sua urgência e dimensão, a situação que se vive atualmente na grande metrópole de  São Paulo assume contornos preocupantes. Apesar de estar localizada não muito longe do mar, separada dele pela imponente cordilheira da Serra do Mar, a grande cidade fica na cabeceira de rios - dos quais o mais importante é o Tietê- que correm para o interior do estado e pertencem à grande bacia do rio Paraná, cujas águas são entregues ao oceano, milhares de quilómetros a sul,  no mar da Plata.  Não existindo um volumoso curso de água na proximidade da cidade, a captação de recursos hídricos para a abastecer  tem de ser feita em pequenas bacias de montanha.

A Grande São Paulo teve um crescimento fulgurante, sobretudo na segunda metade do século passado. Teria pouco mais de 1 milhão de habitantes no início dos anos 40, e conta hoje com 22 milhões. O abastecimento de água e o tratamento dos esgotos tornaram-se um dos maiores problemas da cidade. No final dos anos sessenta, liderada por Abreu Sodré, a prefeitura da cidade, então já com 8 milhões de habitantes, resolveu atacar o problema. Foi nessa altura que, para reforçar o abastecimento de água,  foi projetado um complexo sistema que  consistia na captação em várias bacias de pequenos rios interligadas entre si. Essas bacias situam-se na zona a norte de São Paulo, ocupando uma vasta área que se estende até ao estado de Minas Gerais.  O sistema, inaugurado em meados dos anos 70,  ficou conhecido como sistema Cantareira e é, atualmente, o mais importante de São Paulo. Com um débito de 33 metros cúbicos por segundo, fornece água para cerca de 9 milhões de pessoas que representam 40% da população.

O sistema foi pensado para aguentar sete anos consecutivos de seca. Mas os dois últimos anos hidrológicos, com precipitação  muito abaixo da média, e o consumo acima das previsões, secaram o Cantareira. Em maio passado, foi necessário recorrer ao "volume morto", bombeando para as condutas a água da barragem que fica abaixo da cota de captação. Essa reserva prevê-se que se esgote dentro de mês e meio. Estamos no começo da primavera austral, e os paulistanos rezam pela chegada das habituais chuvas de verão. Se elas não ocorrerem, numa intensidade suficiente, São Paulo morrerá de sede. As autoridades do Estado, nomeadamente o Governador Geraldo Alckmin, em ano eleitoral, asseguram que a chuva virá e que o problema ficará resolvido. Mas muita gente, sobretudo entre as camadas mais esclarecidas da população, começa a ficar seriamente preocupada.

Gritantes desigualdades sociais, graves erros urbanísticos, falta de casas, perdas de 40% de água nas condutas, elevados níveis de poluição, são outros enormes problemas, não resolvidos, da Grande São Paulo. Os investimentos para despoluir os rios, para ampliar as captações, para rever todo o sistema de condutas serão astronómicos. No horizonte de décadas - o tempo da próxima geração! -, São Paulo é uma cidade ameaçada. Que acontecerá no futuro? Continuará a haver crescimento como exige a economia ou  deixará de haver crescimento como exige a sustentabilidade? Se  houver crescimento a cidade corre o risco de colapsar à mingua de água; se não houver crescimento, o colapso resultará do sufoco económico. Estamos perante a impossibilidade do "crescimento sustentável", o oximoron de que falava Albert Bartlett.

Este exemplo ilustra bem o problema dos limites ao crescimento, o mais urgente da nossa Civilização.

Sem comentários:

Enviar um comentário