segunda-feira, 30 de março de 2015

O Envelhecimento do Interior

O progressivo envelhecimento da população portuguesa, que a nível da totalidade do território é muito preocupante, atinge nos concelhos da Beira Interior a sua mais acutilante expressão. Esse envelhecimento tem-se traduzido numa diminuição acentuada da população desses concelhos ao longo das últimas décadas, e caracteriza-se por uma alteração significativa da sua estrutura etária. Ao invés do que acontece nos territórios rejuvenescidos, nos concelhos do Interior a pirâmide de idades engrossa de baixo para cima.

O concelho de Almeida é um exemplo bem representativo dessa situação. No recenseamento de 1960 foram aqui contabilizados 5024 jovens com menos de 15 anos e 1153 idosos com mais de 65 anos. No recenseamento de 2011, o número de jovens baixou para 592 e o de idosos subiu para 2673. Ou, dito de outra forma e em termos aproximados, em 1960 existia um idoso por cada 5 jovens, e em 2011 existem 5 idosos por cada jovem. A relação entre o número de idosos e o número de jovens, multiplicada por 100, é o chamado coeficiente de envelhecimento que assumiu, em Almeida, os seguintes valores:
1960   - 23 
2001 - 271 
2011 - 452

Com a natalidade bruta muito baixa e em decréscimo - entre 2 a 3 nados vivos por cada mil habitantes, em cada ano -, com o aumento da esperança de vida e com o previsível retorno de reformados emigrados às suas localidades de origem, o coeficiente de envelhecimento vai, seguramente, agravar-se nos próximos anos. Estimo que em 2021 o seu valor possa estar mais perto de 1000 do que de 500, configurando-se uma situação inédita e potencialmente desoladora para a região.

Quais as consequências desta realidade? Em primeiro lugar, será de esperar que a população escolar do concelho continue a diminuir. Na última reunião do Conselho Geral do Agrupamento de Escolas de Almeida - de que faço parte -, alguém referiu que terão nascido 12 crianças no concelho de Almeida durante o ano transato. Estas crianças serão insuficientes para formar uma turma quando chegarem à idade escolar. Uma das duas escolas do Agrupamento poderá ter de ser sacrificada e até a continuidade da outra estará em risco. Eventualmente, dentro de uma dúzia de anos, uma boa escola inter-concelhia poderá ser suficiente para cobrir as necessidades de dois ou mais concelhos do Interior raiano.

Se entretanto nada for feito, a desertificação populacional vai progredir, e afetará a já reduzida população ativa. Menos alunos, significará menos professores. E menos professores significará menos comércio, menos casas arrendadas, menos empregos. Com o tempo, escassearão os idosos e as próprias estruturas de apoio à terceira idade tornar-se-ão excedentárias. Logo, haverá redução de empregos num dos únicos sectores fora da administração pública que ainda emprega pessoas.

Sem outras medidas paralelas, estimular a natalidade não é solução. Pois tal com acontece com as sementes que só germinam na terra fértil, também o problema de Almeida é, antes de tudo, a falta de uma população em idade fértil capaz de se reproduzir. Ora, tal como disse Albert Bartlett, o planeamento demográfico exige tempo, e são precisos 70 anos para inverter tendências. Na verdade, com a gravidade do panorama atual só uma revolução será capaz de alterar este estado de coisas.

A gravidade da situação é tal que já não se pode esperar pelos censos de 2021 para confirmar o diagnóstico do mal. Chegou a altura de tocar a rebate. Em junho de 2014, propus na conferência promovida pela Associação dos Territórios do Côa, realizada em Vilar Formoso com o tema Partilha de Testemunhos Rumo ao Horizonte Próximo, a criação um observatório demográfico - e, eventualmente, económico e social -, que permita antecipar a evolução previsível de indicadores e planear as medidas a tomar. Torna-se cada vez mais urgente concretizar essa proposta.

A gestão corrente, quase exclusivamente focalizada na procura de formas para aceder aos fundos comunitários, funciona como uma droga: adormece mas não cura. O repovoamento, em paralelo com a revitalização do tecido económico, deve ser a prioridade número um do concelho. Para tal é necessário, com o apoio e intervenção da administração central, alterar as leis da terra - sem ofender direitos e tradições -, atuando preferencialmente pela via fiscal e incentivar a fixação de novos povoadores à semelhança do que já se faz em Alfandega da Fé. As riquezas de Almeida são a terra, a história, a cultura e o valor do ambiente- felizmente ainda preservado. Valorizar estes fatores, e transformá-los em formas de atração de pessoas e de desenvolvimento económico, é o único caminho a seguir para construir o futuro.


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