terça-feira, 22 de novembro de 2016

A Europa depois do Brexit

No passado dia 10 de Novembro, voltei à Sociedade de Geografia de Lisboa. Desta vez, foi para ouvir Carlos Gaspar e Nuno Rogeiro falarem sobre a Europa depois do brexit. A conferência estava inserida num ciclo denominado: A Europa numa encruzilhada. Foi com um discurso breve e conciso mas marcadamente pessimista que Carlos Gaspar - um especialista em relações internacionais - abriu o debate. Disse que a construção da Europa foi feita para ser uma ever closed union, significando com isto que no edifício europeu havia uma porta de entrada, mas não havia uma porta de saída. Tudo começou com o grupo dos seis do Tratado de Roma, que haveria de crescer primeiro para nove, depois para quinze e por aí fora até aos atuais 28. Ora, ainda havia países a bater à porta da União quando aconteceu aquilo que não estava na cabeça de ninguém: a saída de um membro. E logo um membro de peso: o Reino Unido. Para o palestrante, isto é uma reversão da ideia original e marca o início da desconstrução da Europa.

Carlos Gaspar considera esta saída paradoxal tendo em conta que, no rescaldo da II Guerra Mundial,  a Inglaterra foi um dos grandes impulsionadores da ideia de criar uma Europa Unida. Lembra, a propósito, o pensamento de  Churchill e associa-o à ideia da formação de um exército europeu e à criação da NATO pelo o tratado de Washington. Refere ainda que, mais recentemente, o Reino Unido dentro da Europa estava no centro do programa de governo de Tony Blair. Considera que a Nato e a Inglaterra são dois pilares onde assenta a construção europeia, razão pela qual não consegue imaginar a Europa sem o Reino Unido. Ela ficará desequilibrada pelo peso da Alemanha, país que, na sua opinião, não reúne nem as qualidades políticas nem diplomáticas para substituir a Inglaterra. E remata a sua intervenção concluindo: o brexit tem tudo para correr mal.

Nuno Rogeiro, um conhecido jornalista interessado pelos temas da politica internacional, falou a seguir. Num tom menos fatalista, começou por comparar o e brexit e a eleição de Trump. Encontra analogias nos dois acontecimentos, chamando-lhes processos dinâmicos, visto não estarmos perante situações definitivas. São, no seu ponto de vista, processos regulares, não irreversíveis. Um dia, tudo pode vir a mudar: o Reino Unido poderá voltar à casa comum dos europeus e  virá tempo em que Donald Trump deixará a Casa Branca e os democratas poderão voltar a ocupá-la. Tanto o resultado do referendo no Reino Unido como a eleição de Trump têm a ver com a percepção dos eleitores de que alguma coisa não está a ir bem. No caso do brexit refere-se à complexidade do processo considerando que existem, no Reino Unido, três tipos de partidários da saída da União Europeiaos envergonhados, os assumidos, e os independentistas radicais  do UKIP. Acrescenta que os ingleses invocaram três  razões para o brexit : 1) que o Reino Unido dá mais do que aquilo que recebe da Europa; 2) que existe um excesso da burocracia e do peso legislativo na UE e que 3) o problema dos refugiados veio criar uma grande insegurança das fronteiras. Para explicar a eleição de Trump fala da existência de bolsas de pobreza nos Estados Unidos e na subversão dos conceitos de direita e de esquerda. 

Generaliza-se a ideia de que existe um caminho de retrocesso na Europa. Alguns acreditam que depois de um passo atrás poderá haver dois para a frente. Que a Inglaterra pode voltar ao seio da União, e que Trump pode deixar a Casa Branca. Mas, acho eu, nada voltará a ser como dantes. Não se podem já apagar as marcas dos ventos da história que levaram os homens à Lua, que emanciparam os povos das antigas colónias europeias, que ergueram e derrubaram muros, que trouxeram o conforto às nossas casas, a mobilidade e o estado social. E que trouxeram uma nova forma planetária de comunicar. 

O regresso dos nacionalismos é contrária à corrente implacável das leis da evolução. O encerramento de fronteiras e o regresso do protecionismo económico  - este, curiosamente, defendido tanto pela esquerda como pela direita radical - vai ao arrepio da exigência do crescimento económico. Só pode levar à recessão e às consequências que ela acarreta nos planos financeiro, social e assistencial. Mas a globalização consumista, predadora de recursos e poluidora também não é solução. Estamos perante um dilema. E convém não esquecer que são os dilemas que estão na origem das guerras.

A virtude só pode estar no meio: nem protecionismo nem globalização selvagem. Ora, a virtude emana dos homens bons e sensatos. No ruído da confusão que está a percorrer o mundo e a extremar posições já ninguém parece querer ouvir a sua voz.

1 comentário:

  1. Caro Luís Queirós, não lhe posso dar os parabéns pelo post.

    Vi um cinzentismo de ideias que se baseiam num «mais do mesmo», com pouca compreensão do que está a acontecer a vários níveis:

    1 - A «nossa casa europeia» é governada por comissários que ninguém sabe de onde vêm e a quem obedecem - aos europeus não será seguramente.

    2 - Esta recente enorme onda de emigração dos países do Médio Oriente e da Ásia Central deve-se às guerras que o complexo militar-industrial americano lá tem despoletado. Com que objectivos?

    3 - A evolução tecnológica está em evolução exponencial. Se até aos anos 80, a tecnologia criava novos empregos para substituir aqueles que destruía, a partir daí isso deixou de acontecer. Daí, o desemprego e subemprego maciço que se verifica em todos os países desenvolvidos.

    4 - Em vez de aproveitar esta evolução tecnológica de forma inteligente, continua-se a batalhar pelo emprego. Já reparou no absurdo: agora que, graças à tecnologia, temos a maior capacidade de produção da História, não se produz porque as pessoas, sem salários ou salários miseráveis, não têm dinheiro para comprar. Que economia paradoxal e criminosa é esta?

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