Nesta nossa era digital, a facilidade que temos em registar e difundir documentos e imagens está a permitir à Humanidade criar um arquivo fabuloso. Nunca, em tempo algum da História, a capacidade de criar memória para as futuras gerações foi tão ampla como é na actualidade.
A cada dia que passa, esta capacidade amplia-se e cresce em espiral. Cada registo criado pode replicar-se facilmente, de tal modo que poderá destruir-se nuns locais e preservar-se em muitos outros. O espaço de arquivo necessário, tão reduzido que é, também não se afigura limitativo ao seu crescimento. E o suporte digital onde se gravam os registos não se degrada facilmente, ao contrário do que se passava com os registos analógicos antigos (escrita, fotografia, filmes, monumentos...).
Projectando para o futuro o que se passa hoje, somos levados a pensar que, nos próximos tempos, esta memória poderá multiplicar-se quase até ao infinito. Dentro de 5 ou 10 gerações, cada ser humano poderá aceder aos registos digitais de texto, imagens e sons sobre factos e acontecimentos das gerações precedentes. E poderá construir, por exemplo, uma árvore genealógica com milhares dos seus antepassados.
Porém, como irá a Humanidade conviver com esta memória colectiva, de tamanha abrangência, já hoje tão ampla e ainda maior no futuro? Não será esta memória um pesado lastro a carregar, que acabará por enredar a própria mente humana, impedindo-a de evoluir e de criar? Até porque esta memória, por ser objectiva e indestrutível, não terá a benevolência da memória humana, a qual se esbate com o tempo, e esvai-se mesmo quando “não convém" recordar. Ao invés, esta será viva, actuante e implacável.
Numa perspectiva religiosa e evolucional, bem pode ser que este seja apenas um degrau a caminho do ponto ómega, desse "Fenómeno Humano" de que falava o padre Teilhard de Chardin. O que contará não será tanto o Homem enquanto Indivíduo, mas a Humanidade, essa entidade nova não apenas com Memória mas também com Alma e com Inteligência.
Vejo nisto sobretudo um sinal de uma complexidade crescente. E acredito que, num determinado momento, os custos de manter essa memória virão a ser maiores do que as vantagens que nos traz. Imagino que, por essa razão, não poderá ser mantida. E que chegará o momento do “colapso” digital, com consequências imprevisíveis.
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