terça-feira, 21 de maio de 2019

Ética e Ciências da Vida


As Ciências da vida são muitas – por exemplo, a medicina, a genética, a biomédica - no sentido lato são um vasto conjunto de Ciências que estudam os seres vivos derivando de um tronco principal que é a Biologia. Surge, entretanto, a Bioética uma área interdisciplinar para a qual concorrem a Biologia, o Direito e a Ética e que estuda as condições para uma gestão(?) responsável da Vida Humana, animal e ambiental e aborda questões tais como: o controlo da natalidade ; a fertilização fora do útero; a clonagem; a manipulação genética; a morte assistida, o prolongamento da vida, as barrigas de aluguer, as leis da adopção, o casamento de pessoas do mesmo género. Todos estes temas desenvolveram-se extraordinariamente nas últimas seis ou sete décadas.

Leio, algures, uma justificação sobre a necessidade de associar a Ética a estas ciências: "o progresso técnico deve ser controlado para acompanhar a consciência da humanidade sobre os efeitos que eles podem ter no mundo e na sociedade para que as novas descobertas e suas aplicações não fiquem sujeitas a todo tipo de interesses". Procuro identificar alguns desses possíveis interesses: e a minha atenção vai, em primeiro lugar, para o que aparece associado ao valor económico desse conhecimento no comércio de embriões humanos; utilizar a fertilização artificial e a gestação laboratorial, para fazer o apuramento da raça humana com fins económicos políticos ou militares; esterilizar populações, raças ou povos através da manipulação genética; a incentivação da eutanásia. Um dia, quando desparecerem os laços familiares, receio que se venha a questionar o valor económico de cada ser humano, resultado do balanço entre a sua "utilidade social" e o custo de o manter vivo. A história já nos mostrou exemplos disso.

O impacto das opções que vierem a ser tomadas será enorme, pois poderá condicionar o futuro da espécie humana. Está em causa muita coisa: a família, a política, o amor, o sexo, a liberdade, a democracia. Penso, muitas vezes, que já se perdeu a finalidade do “instinto de procriação” na espécie humana. É verdade que a atração sexual e o prazer da união consentida se preserva, mas não a última finalidade do ato pois essa foi suprimida pela prática anti-conceptiva a qual funciona como uma forma de iludir a natureza. Preserva-se e amplia-se o prazer sexual mas elimina-se a procriação. Ora, acho eu, que o instinto de sobrevivência, só por si, não é suficiente para preservar a espécie. Dotada apenas deste único instinto, a espécie humana vai envelhecer, não se reproduzirá naturalmente, e acabará por colapsar. Perante esse cenário, a Humanidade vai ter de adotar um processo de reprodução artificial, orientado para suprir as necessidades demográficas e sociais. E esse processo será a expressão de uma nova forma de poder.

Muitas serão as implicações resultantes de tal estado de coisas. Regressamos ao admirável mundo novo, de A Huxley, onde estará ausente o Amor, e que será dominado pelo prazer. Os indivíduos terão funções predeterminadas, muita da sua vida será programada, possivelmente até a Morte. Continuará a haver, neste cenário, sentido para a Vida?

Quando um filho vai ao tribunal responsabilizar os pais por o terem trazido ao mundo - isso parece ter acontecido recentemente - estamos perante uma situação que não pode ser visa como uma simples anedota mas que requer uma reflexão especial. A partir de agora, os filhos deixaram de ser dádivas de Deus e frutos do Amor. Passarão a ser uma opção de conveniência de um ou dois indivíduos que os podem encomendar como uma simples mercadoria com especificações predefinidas. Afinal, uma forma camuflada e aceite de tráfico humano. Este teria sido um belo tema para a tragédia grega com material para re-escrever o Édipo.

Perante isto, interrogo-me sobre o que fazer ou não fazer com este novo conhecimento . Está o debate aberto. Falta-nos a contribuição da história pois não podemos contar - com sempre tem acontecido - com as opiniões dos sábios do passado, aos quis sempre recorremos quando procuramos guias: Sócrates, Platão, Séneca Tomás de Aquino, Kant, Nietzsche e até mesmo Darwin. Isto faz uma grande diferença e aumenta as nossas responsabilidades.

Quem vai participar no debate? É urgente fazê-lo, mas onde? Em cada país? A nível Global? A quem cabe a última palavra? Aos médicos, juristas, teólogos, políticos, economistas ou filósofos ? Num tema tão delicado, quando chegar a hora das grandes opções, temos o direito de usar o “referendo” como forma de decisão, entregando a uma geração o direito de decidir, egoisticamente, sobre o destino de gerações futuras?

Penso que só a Filosofia nos pode ajudar a encontrar as respostas.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

O sonho comanda a vida

Na noite do passado dia 27 de Abril  houve "Conversas sobre Almeida". Estavam anunciadas para o Terreiro Velho, e eu, encontrando-me em Almeida, não poderia faltar. Chego em cima da hora marcada e encontro o lugar deserto, mas não me espanta o facto, pois estou habituado a ver Almeida deserta. Mesmo assim, tento informar-me do sucedido, e descubro que, afinal,  as Conversas têm lugar nas portas interiores de Santo António,  para onde, apressado, me dirijo. Não conhecia a sala, uma surpresa agradável. Umas 40 pessoas estavam ali, vejo alguma caras conhecidas, poucas.

A sessão já tinha começado, o Filipe Vilhena usava da palavra. Apresentava ideias, perguntava porque razão coisas muito simples não se poem em marcha, por exemplo, um parque de campismo. Falou do castelo e da sua reconstrução - lembrando a propósito os interessantes escritos no Praça Alta do arquiteto Samuel Pinto-, referiu o rio Coa e a o urgência de o revalorizar,  mostrou estranheza pelo facto do maior monumento português não estar dignamente anunciado na fronteira de Vilar Formoso, e até falou da possibilidade de construir um pequeno aeródromo no concelho.

Mas a grande surpresa da noite estava para chegar. O Pedro Terreiro - mais tarde descubro que se apresenta no ciber espaço como Pedro Zaz -, falou em seguida. Uma figura franzina, o estilo informal, postura irrequieta de quem tem muito para dizer e sente de forma vibrante o que lhe vai na alma. Assume-se como almeidense com o orgulho e a autoconfiança de quem sabe o que quer e o que vale. Fala de Almeida com transbordante entusiasmo. Refere-se  aos Estados Unidos, à China, ao Japão, ao Brasil como se estivesse a falar de lugares comuns. Insiste em comparar Almeida a Nova York como se fossem duas localidades irmanadas na aldeia global. Os presentes ouviam com atenção, contagiados - diria até hipnotizados - com o entusiasmo do orador.

A proposta do Pedro é simples: Almeida e as suas muralhas reunem condições únicas para produzir arte efémera e, desta forma, valorizar aquilo que é único em Almeida, atraindo pessoas, investimentos, estimulando a economia. Todo o concelho ficará a ganhar. Estimulará o turismo e todas as atividades que vêm atrás dele. A ideia já está concretizada com sucesso noutros países - mostrou um interessante exemplo, no Japão.  De forma convincente, assegura um milhão de visualizações nas redes sociais. Afinal, penso eu, um investimento com um retorno  muito grande, pois se a ação proposta custar cem mil euros o custo por contacto será de 10 cêntimos,  um valor incomparavelmente inferior ao custo por contacto nos meios tradicionais. E que é muito mais eficaz pois dirige-se a um alvo qualificado.

Saio da reunião surpreendido pelo vibrante entusiasmo da proposta do jovem almeidense. Será a arte efémera uma boa aposta para Almeida? Pensando bem, na Natureza, tudo o que é temporal é efémero: A arte, os governos, os países, os impérios, a política, a  economia, a riqueza, o poder e a glória. A vida de cada ser humano é um flash no tempo universal. A própria espécie do homo sapiens  se apagará da Terra, muito antes do nosso planeta ser engolido por um Sol moribundo .

Na sociedade atual do consumismo, do descartável, da voracidade das redes sociais, da novidade permanente,  da facilidade  nas comunicações, das notícias que se atropelam e da fluente mobilidade, o tempo dos homens passa mais depressa. A única certeza que preside ao nosso dia-a-dia é a de sabermos que, amanhã, tudo será diferente e que o tempo não voltará para trás.

O efémero está na moda. E é a moda que confere valor económico aos produtos. Por isso a proposta do Pedro deve ser seriamente considerada. É uma proposta arrojada, inovadora, é criativa, envolve a comunidade local. Vem de um profissional reconhecido internacionalmente e com um currículo invejável. A sua concretização vai estimular a atenção sobre o território, para logo suscitar interesse e o desejo que leva à ação.

O Sr Presidente da Câmara não deve deixar passar ao lado esta oportunidade. O facto da ideia  não vir de nenhum académico iluminado não é um mal, é antes um bem, Mostra que existem almeidenses vivos e com uma Alma grande.

Por aquilo que percebi, os almeidenses que estavam na sala esperam da autarquia um gesto nobre e com visão de futuro. Eu comungo dessa esperança, tenho um palpite de que vai dar certo, e, se for preciso, pago para ver.