segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Plano inclinado

“Plano Inclinado” é o nome de um programa que a SIC Noticias começou a apresentar recentemente, mais precisamente no passado dia 7 de Novembro. E logo na primeira emissão vimos Henrique Medina Carreira falar da situação económica e financeira do nosso país. Sem papas na língua, com a frontalidade que lhe conhecemos.

Veio ele dizer-nos que os discursos dos políticos são desprovidos de interesse, que não se centram naquilo que seria essencial, ou seja, não fazem o diagnóstico do estado da nossa economia. Economia que ele classifica de anémica, e caracteriza por um elevado deficit das contas públicas e uma divida externa a atingir valores incomportáveis. Que tudo isto sucede porque, após a adesão a Euro, Portugal perdeu a possibilidade da desvalorização da sua moeda. Não podendo, por essa razão, manter a competitividade externa e aumentar as exportações.

Acrescenta Medina: “quase tudo se importa, pouco se exporta”; e diz-nos que, apesar da crise actual, neste ano, a divida externa do nosso país aumenta ao impressionante ritmo de sessenta milhões de euros em cada dia, valor muito superior aos quarenta milhões, que era o valor médio diário de aumento nos anos anteriores. E alerta para a excessiva e preocupante contribuição do Estado para o rendimento das famílias, pois dele dependem, entre pensionistas e funcionários públicos, mais de 4 milhões de portugueses.

Esta é a receita que ela propõe: Portugal para aumentar a competitividade, deve ir ver o que se faz nos outros países, e tentar fazer melhor. Deve reduzir a burocracia, fazer funcionar a justiça, ajustar os impostos. Tudo isto para atrair mais investimento e aumentar a produção e competitividade. E a concluir diz o jurista/economista que os nossos políticos são incompetentes e que os eleitores deveriam escolher outros.

Durante o debate falou-se também, como não poderia deixar de ser, das obras públicas do regime. Comentaram-se as auto-estradas desnecessárias, questionaram-se os pressupostos que estão na base das decisões dos investimentos. João Duque, um economista do painel, veio revelar que tinha colaborado num estudo que concluiu pela viabilidade económica do novo aeroporto de Lisboa, apenas porque não lhe foi permitido mexer nos pressupostos da procura.

No mesmo sábado em que “O Plano Inclinado” foi pela primeira vez para o ar, o Expresso mostrava uma “infografia” sobre a alta velocidade ferroviária. Ali ficámos a saber que a linha do TGV que ligará Lisboa ao aeroporto, seguirá pelo caminho mais longo. Como que a contrariar a ideia que o caminho mais curto entre dois pontos é uma linha recta.
Ora isto acontece porque a solução rodo-ferroviária da nova travessia para o Barreiro a isso obriga. Admito que interesses imobiliários que têm a ver com os terrenos da Quimiparque, no Barreiro, e da antiga Siderurgia, no Seixal, imponham essa solução. Só que o preço a pagar é muito elevado: trazem-se mais automóveis para Lisboa, destrói-se a frente ribeirinha do Barreiro, complicam-se os acessos em Lisboa, secundariza-se a ligação ao novo aeroporto.

E, falando ainda de pressupostos, diz a mesma "infografia" do Expresso que o tráfego esperado para a ligação de Alta Velocidade de Madrid para Lisboa será de 9.4 milhões de passageiros. Ora isso é uma falácia, é mais um pressuposto para justificar o injustificável. Presumo que os tais 9,4 milhões incluem o tráfego de proximidade nos arredores e Lisboa e de Madrid, tráfego que nada terá a ver com o TGV.

O tráfego anual de longa distancia entre Madrid e Lisboa não será, no curto prazo, superior a um milhão de passageiros. É própria Rave que o admite, num estudo publicado em 2005, no qual estima, para 2030, não mais do que 1,6 milhões de passageiros/ano no trajecto de longa distância. Ora, e ainda e acordo com a Rave, considera-se que 36% desse tráfego directo seja desviado para o comboio de alta velocidade, ou seja 360,000 passageiros por ano, cerca de mil por dia. Dará escassamente para encher dois comboios diários de ida e volta, um a partir de Madrid, outro de Lisboa. O que, convenhamos, é muito pouco considerando o investimento a realizar.

Galileu estudou as leis do movimento no plano inclinado. E concluiu que a aceleração é constante e a velocidade do móvel aumenta continuamente com o tempo. É desta maneira que vai a nossa economia, a caminho do abismo. E nós, os portugueses, alegremente e despreocupadamente a vê-la ir. Provavelmente já foi ultrapassado o ponto de “não retorno”. Temos de preparar-nos para o embate!

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