O referendum que teve lugar na Escócia no passado dia 18 de setembro, veio colocar uma serie de interrogações sobre a construção da Europa e sobre o seu futuro. Estamos muito longe de 1707, quando foi assinado o tratado de União entre a Inglaterra e a Escócia que criou o Reino Unido. Desde então, o conceito de soberania afirmado no poder económico e militar, e que
prevaleceu no século XIX e em grande parte do Século XX, alterou-se
profundamente. Por um lado, a globalização, os acordos de comércio livre, a internacionalização do capital financeiro mudaram a economia, e, por outro lado, a sofisticação do armamento, as comunicações, a mobilidade demográfica, a expansão das organizações terroristas, a dissuasão nuclear, mudaram o conceito de defesa e a forma de fazer as guerras. Alterado o conceito de soberania, altera-se também o conceito de independência. Alex Salmond percebeu isso e foi a votos.
A Europa, no pós guerra, começou por ser construída por nações soberanas, mas, sobretudo após o alargamento a Leste, com a adesão de pequenos países desmembrados de estados - como foi o caso
dos estados Bálticos ou países da ex-Jugoslávia como a
Eslovénia, ou a Bósnia - passou a desenhar-se como um espaço de regiões. Terá sido esse facto que excitou os impulsos independentistas de regiões com tradição de autonomia como é o caso - para citar apenas os dois exemplos mais notórios - da Escócia e da Catalunha. Neste novo contexto, os escoceses e os catalães não encontram- mesmo sendo países pequenos- razões para não ter assento direto em Strasbourg à semelhança do que acontece com aqueles outros atrás referidos.
A União Europeia é uma construção que se baseia numa força centripeta. E, tal como acontece num sistema planetário, essa força atrativa exige uma centralidade. Ora, no caso da União Europeia - e mesmo que isso custe a outros países - , essa centralidade é a Alemanha. A Inglaterra vive ainda a nostalgia do Império que a Commonwealth tenta preservar; a França nunca se recompôs do desaire de Waterloo; e a Espanha estiolou com a Inquisição e sucumbiu de vez com a derrota da Armada Invencível. A Itália, com atores da envergadura de Berlusconi, tem sido e continuará a ser o palco de uma opera cómica. Apenas a Alemanha que perdeu duas guerras, mas que não tem fantasmas de glórias passadas a ensombrar-lhe o presente, se pode assumir - e tem-no feito - como centralidade europeia. E isto apesar da Inglaterra aspirar a ter um papel no Novo Ocidente que se pretende construir à volta do Atlântico Norte sob a proteção do dólar e da Nato. Em conclusão, o "sim" da Escócia, enfraquecendo a Inglaterra, que atua como força centrifuga, fortaleceria a Europa.
A Escócia fez o seu primeiro ensaio. Voltará a jogo nos próximos anos, e auguro que, dessa vez,o resultado será diferente. Cada crise, cada insucesso, cada nova ingerência nos seus destinos, saldará-se-á num reforço do "sim". A Catalunha e o País Basco espreitam. A Córsega poderá vir a seguir. Não se advinha fácil a tarefa de construir a Europa.
Thinking Outside the Grid
Há 5 anos
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