quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Gerir o Tempo

Nas gerações que nos precederam - mesmo nas que estão mais próximas de nós: as dos nossos pais e avós -, a forma das pessoas passarem o tempo era muito diferente da nossa. O homem do paleolítico, praticamente, passava todo o seu tempo de vigília a recolher alimentos e a caçar. Na Idade Média, uma boa parte do tempo era dedicado ao trabalho na terra e à religião. Na era industrial, o trabalho na fábrica passou a ocupar muito do tempo antes usado na agricultura. Na sociedade de excedentes, possibilitados pela era do carbono, ganha importância o chamado tempo livre. Ou seja, a convivência social, a televisão, a cultura, o desporto, a internet, as viagens e o shopping preenchem a maior parte do nosso tempo de lazer diário.

Há uns anos atrás, os anunciantes faziam estudos visando conhecer a forma como as pessoas repartiam o seu tempo pelos diversos meios: imprensa, rádio e televisão. A intenção era alocar os investimentos publicitários naquela mesma proporção. Em França, onde estes estudos estiveram muito em voga, chamavam-se os études budjet temps. Em Portugal não tenho conhecimento de que essas pesquisas alguma vez se tenham realizado. Por isso, como gosto de números, decidi fazer um exercício empírico e aproximativo: estimar, com base em alguns dados existentes e muito senso comum, como se distribui a ocupação das 168 horas (24x7) semanais de um português médio ativo, adulto e urbano. O resultado a que cheguei - aceito, com agrado, sugestões de alteração! - para esse balanço de tempo foi o seguinte:
    horas       %
Tempo de repouso5633,3
Tempo de trabalho47,528,3
Tempo digital 3017,9
Tempo social11,56,8
Tempo familiar 2011,9
Tempo íntimo31,8
Tempo interior e espiritual00,0
Total 168100,0
Notas: Tempo de repouso: São 8 horas por dia, 56 horas por semana; tempo de trabalho: inclui 35 horas de trabalho semanal, deslocações e refeições no trabalho; tempo digital inclui o tempo dedicado a ver televisão, a ouvir rádio, falar ao telemóvel, dedicado ao computador e à internet (incluindo o que é passado nas redes sociais); tempo social inclui refeições fora do trabalho, idas a espetáculos, tempo pssado nas compras, cultura, leitura, tempo passado com amigos fora de casa; tempo familiar inclui refeições fora do trabalho (tomadas em casa) e o tempo passado, em casa, com a família e amigos; tempo íntimo refere-se ao tempo dedicado à higiene pessoal e necessidades fisiológicas; tempo interior refere-se ao tempo de reflexão interior e ao tempo espiritual e religioso.

Feito o exercício, e distribuído o tempo pelas diferentes formas de o ocupar, constatei que não me sobravam horas para atribuir à última parcela, o tempo interior e espiritual. Haverá, com certeza, pessoas que dedicam muitas horas a esta ocupação; no entanto, a estatística vive de médias e, neste caso, a média estará muito próxima de zero. Ao invés, atente-se na importância atribuída ao tempo digital (18% do total, 27% do tempo de vigília!), uma utilização recente, e que se prevê venha a aumentar muito no futuro.

Sendo o tempo a matéria prima de que é feita a vida, é surpreendente o pouco cuidado que colocamos na sua utilização. Parece que o desperdiçamos, às vezes, até voluntariamente e com prazer, pois não nos detemos a orçamentar e a planear a forma como o despendemos. Veja-se, por exemplo, o tempo passado a ver televisão - 22 horas por semana, quase 20% do nosso tempo de vigília. Esse tempo, que se traduz afinal na atenção dedicada ao pequeno ecrã, é, por sua vez, disputado pelas emissoras que o utilizam em proveito próprio, vendendo-o aos anunciantes ou valorizando-o para dar protagonismo a políticos, homens de negócios, artistas, figuras públicas etc. E o que se diz em relação à televisão pode estender-se a certo tipo de literatura e de imprensa.

A economia global, a política e a comunicação social reclamam o nosso tempo. A nós cabe-nos cuidar de o gerir, de o não desbaratar levianamente e de não deixar que outros se apropriem dele. Embora os minutos sejam todos iguais, a forma como os utilizamos pode ser diferente. Na nossa vida alguns minutos valem mais do que outros, pois só alguns são verdadeiramente nossos. O tempo interior, aquele em que nós nos confrontamos connosco próprios, é o nosso tempo mais precioso. Sem tempo interior e espiritual, o homem deixa de ser dono e senhor do seu destino. É como um barco que voga ao sabor das correntes e dos ventos. Não traça o seu rumo; deixa-se ir para onde o levam.

A globalização, a tecnologia, a forma de comunicar e consumir informação, estão a roubar o tempo interior do homem. Os que nos fornecem informação e nos viciam no seu consumo acabam por processá-la e digeri-la por nós e para nós. E ao compelirem-nos a consumir sempre mais e mais, acabam, desta forma, por criar um círculo vicioso e uma perigosa adição. Por isso, acredito que muitas das depressões do nosso tempo são provocadas pela sofreguidão no consumo do tempo e pela má gestão na sua utilização.

A forma como um povo gasta o seu tempo mostra o seu estado de saúde como sociedade, e é revelador do que podemos esperar quanto ao seu futuro. Muitos dos nossos hábitos de vida estão dependentes de redes muito frágeis cuja sustentabilidade está ameaçada. Ora isso ilustra a pouca resiliência desses hábitos e as contingências que o futuro nos pode revelar. A boa gestão do tempo terá de ser uma forte e permanente preocupação daqueles que acreditam e querem empenhar-se na caminhada para um mundo novo.

sábado, 23 de novembro de 2019

O Eu e a Mente

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Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém!
José Régio
Quando o meu cão se vem enrolar aos meus pés e se mostra agradado pela minha companhia, eu interrogo-me sobre o que se passa no cérebro deste dócil companheiro. O meu cão vive apenas o momento presente, ele tem passado mas não o evoca, e também não se preocupa com o futuro. A cada dia basta-lhe o seu cuidado. Tudo no meu cão se orienta para a vida e para a reprodução. A fome, a sede e  o sexo são as suas pulsões. Eu posso condicioná-lo, como fez Pavlov, e com isso provocar-lhe prazer ou conflitos e sofrimento.

Ele não sabe que a Terra é redonda, nem conhece a importância do ar que respira.  E  não sabe que vai morrer um dia. Eu sei que o meu cão não pensa, mas sente. E sei todas aquelas coisas que o meu cão não sabe, mas, às vezes, tenho inveja dele. Como gostaria de desligar, a meu bel-prazer e pelo tempo que quisesse, a corrente do pensamento, e ficar, como este fiel amigo, apenas a respirar e a viver plenamente o aqui e o agora.

O pensamento e a consciência do eu são atributos exclusivos da espécie humana. Um dia, no caminho da evolução, um hominídeo, pela primeira vez, ter-se-á apercebido de que existia como indivíduo: eu sou este individuo; eu estou aqui; eu faço isto; eu quero aquilo.  E, por analogia, ao perceber que existia, adquiriu a consciência da existência do outro. A observação da morte do seu semelhante (do outro) e a consciência do eu, produziram uma revelação extraordinária: a perceção da sua própria morte. Esta tomada de consciência do eu e da morte foi a prodigiosa mutação que transformou a espécie humana. Criou o Ego que se transmitiu aos descendentes, e que, pela seleção natural, permitiu desenvolver o cortex cereberal. O homem mais inteligente passou a ser o mais apto. E a evolução, como nos ensinou Charles Darwin, fez o resto.

A linguagem, permitindo a representação verbal dos conceitos, deu-lhes expressão e significado. Primeiro às coisas, depois às ações e aos sentimentos, e, finalmente, às emoções. A observação e a experiência conduziram à dedução e ao pensamento lógico. As representações expressas pela linguagem, articularam-se entre si, e produziram o pensamento que, por sua vez, permitiu criar o conhecimento científico. Esses conceitos foram integrados no espaço (aqui, acolá, perto, longe) e no tempo (agora, logo, antes e depois).

Através do pensamento, o homem  antecipa o futuro, imagina e cria. Transformou-se num ser superior consciente e inteligente.  Mas o eu das pulsões e dos instintos não desapareceu.  O homem passa a ficar dividido: a consciência passou a ser um eu superior, que é  o Ego ou o Ich (em alemão) ,  e o outro eu, o inconsciente, é o Id  que é o eu do meu cão. O eu inferior não distingue o pensamento da realidade, pois não distingue as coisas das suas representações. A presença do leão ameaçador provoca medo e faz libertar adrenalina; mas a representação mental do leão imaginado, confunde o Id e pode provocar as mesmas reações.

Foi Sigmund Freud quem propôs este modelo da mente humana. O conceito subjetivo de Bem e de Mal levou Freud a acrescentar ao Id (que sente)  e ao Ich (que conhece, pensa e prevê),  o Uber-Ich ou Superego que é o eu que julga. O superego é o eu social que deriva da moral, da  religião, e das normas sociais.  E está na origem do pecado, da culpa e de muitas neuroses. Com este modelo, Freud explicou a Alma, Deus e o Diabo, como Galileu tinha explicado, dois séculos antes, o funcionamento do sistema solar.

A complexidade e a fragmentação da mente humana leva ao conflito interior, à divisão, ao sofrimento e ao medo psicológico (perante a ameaça imaginada, em oposição ao medo natural, perante a ameça real). O pensamento condicionado, pela cultura, pela memória, pela religião e pela educação, não é libertador, antes pelo contrário, projeta-nos no tempo passado e no tempo futuro, e conduz à ansiedade e à depressão. Cria-se um circulo vicioso, vivemos nos meandros de um labirinto, e quanto mais lutamos para saír dele, mais fragilizados ficamos, e mais se nos obscurece o caminho da saída.

Felizmente, não estamos condenados ao castigo de Sísifo, aquele de ter de carregar perpetuamente a pedra montanha acima e, chegados ao cume, desesperados, vê-la rolar de novo pela encosta abaixo, e termos de recomeçar tudo outra vez. A fórmula da libertação deste absurdo sofrimento, estava inscrita no Pórtico de Delfos: "Conhece-te a ti próprio e conhecerás o Univeso e as suas leis".  Foi este o caminho percebido por tantas mentes superiores, as Almas Grandes, os filósofos que viveram orientados pela busca do Bem, da Justiça e da Verdade.

A grande e angustiante interrogação do homem consiste em saber se existe alguma coisa para lá do pensamento e do tempo. Algo eterno, intemporal. Para responder a esta questão o homem construiu e sacralizou a figura  de Deus, organizou-a conferiu-lhe uma imagem, deu-lhe atributos.  Surgiram as religiões e o circo que as envolve. A interrogação permanece.

Mas a evolução do Homem não pára.  Eu acredito que podemos estar a adquirir um eu metafisico, uma espécie de eu universal, uma simbiose do Homem com o Universo e com o Criador. Será este eu que nos libertará do ódio, da ambição e das neuroses e nos permitirá atingir a permanente clarividência. Acredito mesmo que a aquisição desse eu será o salto no processo evolutivo que nos abrirá o caminho da Transição para uma Nova Humanidade.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

A Humanidade em Rede


O padre jesuíta Teilhard de Chardin, o autor do "Fenómeno Humano", foi um  paleontólogo que viveu na primeira metade do século passado, e cujas ideias estiverem muito em voga nos anos 60. Foi ele quem criou a Teoria do Ponto Ómega. Trata-se de uma visão evolucionista do Homem, ao arrepio das conceções tradicionais do Cristianismo. Para ele, o Homem está a evoluir para uma crescente complexidade, a sua inteligência vai projetar-se no sentido universal, a Humanidade ressurgirá como uma entidade nova, transumana, dotada de Alma e Inteligência. E, para o padre, cumprem-se assim as  escrituras, referindo-se certamente a Cristo que disse, pela pena do evangelista João, "Eu sou o Alfa e o Ómega".

Toda a evolução do Mundo, a partir da morte de Teilhard de Chardin, ocorrida em 1955, leva-nos a refletir sobre estas ideias. A globalização e a a forma dos humanos se relacionarem entre si, transformou o Homem e está a transformar a Humanidade, de uma forma de que ainda não são visíveis as consequências. Notícias recentes dão-nos conta  que 50% da população mundial já acede à Internet. São 3,5 mil milhões de pessoas. Uma outra notícia diz-nos que qualquer coisa como 2,5 mil milhões de pessoas são os utilizadores do Facebook.

A sociedade humana está em rede, e  isto já trouxe e vai continuar a trazer importantes modificações para o nosso futuro coletivo. O homem em rede é um homem novo, e será, no futuro um homem muito diferente. Esta revolução da Internet só tem paralelo com a invenção da escrita e sobretudo com a invenção da imprensa. A globalização começa com Gutemberg, e amplia-se com os  novos mensageiros, a rádio, a televisão o velho telefone analógico, o telefone pessoal, o email a Internet, e as redes sociais. E tudo isto é irreversível, e já está nos genes da Civilização.

De fato, a Rede é a primeira concretização do conceito de Humanidade como um organismo vivo. Cada ser humano está a perder a sua individualidade, não passa de uma simples célula deste novo organismo complexo. A sua existência, só pode ser assegurada dentro do todo. Tal como formiga só existe no formigueiro, e a abelha no enxame, também o Homem só se justifica na Sociedade. Que a Globalização ampliou e que hoje se confunde com a própria Humanidade.

Podemos estar a sacrificar conceitos como são a consciencia e o livre arbítrio, valores associados à alma, questionar a responsabilização do individuo, e pôr em causa toda a filosofia, cultura e ética desenvolvidos nos últimos dez mil  anos. Podemos estar no início de um processo que conduzirá a uma nova religião e, sobretudo, a uma nova moral. O "Admirável Mundo Novo" de Huxley, ou o "1984" de Orwel podem ser antevisões - mesmo que deformadas - dessa nova realidade.

Mas  a complexidade dessa nova organização traz outros riscos. A complexidade da própria Rede é muito grande e ela é, por isso mesmo, muito vulnerável. Nesta forma de  evolução desenvolveu-se um novo órgão da nova entidade coletiva. O futuro do Homem vai depender da saúde deste novo órgão e das suas capacidades. Por que as células não sobrevivem à morte do ser que elas integram.

Theilhard de Chardin foi um visionário no seu tempo. Mas aquilo que parecia uma  miragem há 50 anos é hoje uma realidade. Tempos de grande incerteza e de alto risco estão diante de nós. Mas para as próximas gerações serão também tempos de aliciantes desafios e de importantes transformações.


terça-feira, 21 de maio de 2019

Ética e Ciências da Vida


As Ciências da vida são muitas – por exemplo, a medicina, a genética, a biomédica - no sentido lato são um vasto conjunto de Ciências que estudam os seres vivos derivando de um tronco principal que é a Biologia. Surge, entretanto, a Bioética uma área interdisciplinar para a qual concorrem a Biologia, o Direito e a Ética e que estuda as condições para uma gestão(?) responsável da Vida Humana, animal e ambiental e aborda questões tais como: o controlo da natalidade ; a fertilização fora do útero; a clonagem; a manipulação genética; a morte assistida, o prolongamento da vida, as barrigas de aluguer, as leis da adopção, o casamento de pessoas do mesmo género. Todos estes temas desenvolveram-se extraordinariamente nas últimas seis ou sete décadas.

Leio, algures, uma justificação sobre a necessidade de associar a Ética a estas ciências: "o progresso técnico deve ser controlado para acompanhar a consciência da humanidade sobre os efeitos que eles podem ter no mundo e na sociedade para que as novas descobertas e suas aplicações não fiquem sujeitas a todo tipo de interesses". Procuro identificar alguns desses possíveis interesses: e a minha atenção vai, em primeiro lugar, para o que aparece associado ao valor económico desse conhecimento no comércio de embriões humanos; utilizar a fertilização artificial e a gestação laboratorial, para fazer o apuramento da raça humana com fins económicos políticos ou militares; esterilizar populações, raças ou povos através da manipulação genética; a incentivação da eutanásia. Um dia, quando desparecerem os laços familiares, receio que se venha a questionar o valor económico de cada ser humano, resultado do balanço entre a sua "utilidade social" e o custo de o manter vivo. A história já nos mostrou exemplos disso.

O impacto das opções que vierem a ser tomadas será enorme, pois poderá condicionar o futuro da espécie humana. Está em causa muita coisa: a família, a política, o amor, o sexo, a liberdade, a democracia. Penso, muitas vezes, que já se perdeu a finalidade do “instinto de procriação” na espécie humana. É verdade que a atração sexual e o prazer da união consentida se preserva, mas não a última finalidade do ato pois essa foi suprimida pela prática anti-conceptiva a qual funciona como uma forma de iludir a natureza. Preserva-se e amplia-se o prazer sexual mas elimina-se a procriação. Ora, acho eu, que o instinto de sobrevivência, só por si, não é suficiente para preservar a espécie. Dotada apenas deste único instinto, a espécie humana vai envelhecer, não se reproduzirá naturalmente, e acabará por colapsar. Perante esse cenário, a Humanidade vai ter de adotar um processo de reprodução artificial, orientado para suprir as necessidades demográficas e sociais. E esse processo será a expressão de uma nova forma de poder.

Muitas serão as implicações resultantes de tal estado de coisas. Regressamos ao admirável mundo novo, de A Huxley, onde estará ausente o Amor, e que será dominado pelo prazer. Os indivíduos terão funções predeterminadas, muita da sua vida será programada, possivelmente até a Morte. Continuará a haver, neste cenário, sentido para a Vida?

Quando um filho vai ao tribunal responsabilizar os pais por o terem trazido ao mundo - isso parece ter acontecido recentemente - estamos perante uma situação que não pode ser visa como uma simples anedota mas que requer uma reflexão especial. A partir de agora, os filhos deixaram de ser dádivas de Deus e frutos do Amor. Passarão a ser uma opção de conveniência de um ou dois indivíduos que os podem encomendar como uma simples mercadoria com especificações predefinidas. Afinal, uma forma camuflada e aceite de tráfico humano. Este teria sido um belo tema para a tragédia grega com material para re-escrever o Édipo.

Perante isto, interrogo-me sobre o que fazer ou não fazer com este novo conhecimento . Está o debate aberto. Falta-nos a contribuição da história pois não podemos contar - com sempre tem acontecido - com as opiniões dos sábios do passado, aos quis sempre recorremos quando procuramos guias: Sócrates, Platão, Séneca Tomás de Aquino, Kant, Nietzsche e até mesmo Darwin. Isto faz uma grande diferença e aumenta as nossas responsabilidades.

Quem vai participar no debate? É urgente fazê-lo, mas onde? Em cada país? A nível Global? A quem cabe a última palavra? Aos médicos, juristas, teólogos, políticos, economistas ou filósofos ? Num tema tão delicado, quando chegar a hora das grandes opções, temos o direito de usar o “referendo” como forma de decisão, entregando a uma geração o direito de decidir, egoisticamente, sobre o destino de gerações futuras?

Penso que só a Filosofia nos pode ajudar a encontrar as respostas.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

O sonho comanda a vida

Na noite do passado dia 27 de Abril  houve "Conversas sobre Almeida". Estavam anunciadas para o Terreiro Velho, e eu, encontrando-me em Almeida, não poderia faltar. Chego em cima da hora marcada e encontro o lugar deserto, mas não me espanta o facto, pois estou habituado a ver Almeida deserta. Mesmo assim, tento informar-me do sucedido, e descubro que, afinal,  as Conversas têm lugar nas portas interiores de Santo António,  para onde, apressado, me dirijo. Não conhecia a sala, uma surpresa agradável. Umas 40 pessoas estavam ali, vejo alguma caras conhecidas, poucas.

A sessão já tinha começado, o Filipe Vilhena usava da palavra. Apresentava ideias, perguntava porque razão coisas muito simples não se poem em marcha, por exemplo, um parque de campismo. Falou do castelo e da sua reconstrução - lembrando a propósito os interessantes escritos no Praça Alta do arquiteto Samuel Pinto-, referiu o rio Coa e a o urgência de o revalorizar,  mostrou estranheza pelo facto do maior monumento português não estar dignamente anunciado na fronteira de Vilar Formoso, e até falou da possibilidade de construir um pequeno aeródromo no concelho.

Mas a grande surpresa da noite estava para chegar. O Pedro Terreiro - mais tarde descubro que se apresenta no ciber espaço como Pedro Zaz -, falou em seguida. Uma figura franzina, o estilo informal, postura irrequieta de quem tem muito para dizer e sente de forma vibrante o que lhe vai na alma. Assume-se como almeidense com o orgulho e a autoconfiança de quem sabe o que quer e o que vale. Fala de Almeida com transbordante entusiasmo. Refere-se  aos Estados Unidos, à China, ao Japão, ao Brasil como se estivesse a falar de lugares comuns. Insiste em comparar Almeida a Nova York como se fossem duas localidades irmanadas na aldeia global. Os presentes ouviam com atenção, contagiados - diria até hipnotizados - com o entusiasmo do orador.

A proposta do Pedro é simples: Almeida e as suas muralhas reunem condições únicas para produzir arte efémera e, desta forma, valorizar aquilo que é único em Almeida, atraindo pessoas, investimentos, estimulando a economia. Todo o concelho ficará a ganhar. Estimulará o turismo e todas as atividades que vêm atrás dele. A ideia já está concretizada com sucesso noutros países - mostrou um interessante exemplo, no Japão.  De forma convincente, assegura um milhão de visualizações nas redes sociais. Afinal, penso eu, um investimento com um retorno  muito grande, pois se a ação proposta custar cem mil euros o custo por contacto será de 10 cêntimos,  um valor incomparavelmente inferior ao custo por contacto nos meios tradicionais. E que é muito mais eficaz pois dirige-se a um alvo qualificado.

Saio da reunião surpreendido pelo vibrante entusiasmo da proposta do jovem almeidense. Será a arte efémera uma boa aposta para Almeida? Pensando bem, na Natureza, tudo o que é temporal é efémero: A arte, os governos, os países, os impérios, a política, a  economia, a riqueza, o poder e a glória. A vida de cada ser humano é um flash no tempo universal. A própria espécie do homo sapiens  se apagará da Terra, muito antes do nosso planeta ser engolido por um Sol moribundo .

Na sociedade atual do consumismo, do descartável, da voracidade das redes sociais, da novidade permanente,  da facilidade  nas comunicações, das notícias que se atropelam e da fluente mobilidade, o tempo dos homens passa mais depressa. A única certeza que preside ao nosso dia-a-dia é a de sabermos que, amanhã, tudo será diferente e que o tempo não voltará para trás.

O efémero está na moda. E é a moda que confere valor económico aos produtos. Por isso a proposta do Pedro deve ser seriamente considerada. É uma proposta arrojada, inovadora, é criativa, envolve a comunidade local. Vem de um profissional reconhecido internacionalmente e com um currículo invejável. A sua concretização vai estimular a atenção sobre o território, para logo suscitar interesse e o desejo que leva à ação.

O Sr Presidente da Câmara não deve deixar passar ao lado esta oportunidade. O facto da ideia  não vir de nenhum académico iluminado não é um mal, é antes um bem, Mostra que existem almeidenses vivos e com uma Alma grande.

Por aquilo que percebi, os almeidenses que estavam na sala esperam da autarquia um gesto nobre e com visão de futuro. Eu comungo dessa esperança, tenho um palpite de que vai dar certo, e, se for preciso, pago para ver.


sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Se


Se, na adversidade da mais escura noite,
conseguires colocar-te acima das Palavras
e deixares que te guie a Voz Silenciosa da tua Alma.

Se fores capaz de enxergar a Verdade,
atrás da floresta de enganos e das sombras
que, a cada dia, os ecrãs te mostram.
Se conseguires ver na mais pequena flor o milagre da Vida,
e vislumbrar na mais longínqua estrela a mão do Criador

Se recusares usar plástico quando podes evitá-lo,
e assumires o compromisso de não sujares o ar que respiras,
nem a água que bebes, nem os alimentos que comes.
Se conseguires imaginar por detrás da carne da tua refeição
o sacrifício do animal que ta entregou

Se, para subires mais um degrau na tua Consciência,
fores - como disse o poeta - capaz de ir além da dor,
indiferente ao mavioso canto das paixões e dos prazeres.
E fores capaz de esquecer as névoas do Futuro,
quando o Aqui e o Agora reclamam a tua presença.

Se, quando o poder ou a glória te baterem à porta,
te lembrares da gota de sémen como começaste
e  do punhado de cinzas que serás um dia.
E aceitares, com a mesma serenidade, as mudanças certas
- para melhor ou para pior -  que o futuro te trouxer.

Se, com Compaixão, fores capaz de levar Esperança
a uma criança, a um necessitado ou a um  enfermo,
indiferente à sua riqueza, raça, credo ou idioma.
Se fores capaz de te dares aos outros, sem esperar recompensa,
Da mesma forma como a rosa te dá o seu perfume.

Se fizeres do Bem, do Belo, da Justiça e da Verdade
as estrelas que iluminam o teu caminho
Então, serás dono do Tempo. A Eternidade está ao teu alcance.
E - acima de tudo - meu irmão e minha irmã, contribuirás
para fazer deste Mundo um lugar melhor para os teus filhos


quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Mandamentos



Primeiro: Conhece-te a ti próprio; procura dentro de ti as respostas para as tuas dúvidas.

Segundo: Pratica o Bem, ama o Belo, sê justo. Busca o conhecimento

Terceiro: Carpe Diem: Esquece o futuro porque ele é imprevisível e traiçoeiro

Quarto:  Põe o melhor de ti próprio em tudo o que fizeres. Cultiva o ócio, porque este é o único tempo que verdadeiramente te pertence.

Quinto: Aceita da mesma forma a Adversidade e o Sucesso; a Paz e a Guerra; a Vida e a Morte

Sexto: Não tomes nada como certo e definitivo, porque um dia tudo será diferente.

Sétimo Nunca te esqueças que começaste com uma gota de sémen e acabarás como um punhado de cinzas. E o mesmo acontecerá aos teus amigos e aos teus inimigos.

Oitavo. Respeita a Natureza e os seus equilíbrios. Não queiras ter mais do que aquilo que precisas.

Nono. Sê Solidário. Respeita e cuida dos mais velhos, dos mais fracos e dos mais necessitados.

Décimo. Educa as crianças ao teu redor. Dá-lhes tudo e nada lhes peças em troca. Procura que elas sejam melhores e mais sábias do que aquilo que tu foste.