segunda-feira, 18 de junho de 2012

A Grécia e a Europa

À hora que escrevo já se sabe que, na Grécia, a Nova Democracia terá vencido as eleições por uma margem mínima. Mas este facto não vem alterar significativamente a situação que se vive naquele país e na Europa, e a vitória da esquerda só serviria para precipitar os acontecimentos. E, só por isso, até seria desejável. Esta radicalização ou polarização do eleitorado grego vem apenas confirmar o drama que se advinha, nos próximos meses, e que vai resumir-se à angústia de uma escolha: construir ou desconstruir a Europa. Está muito mais em causa do que a moeda única e a sua preservação. Está em causa o futuro da Europa, num mundo em muito rápida transformação.

 O caminho que, no período pós-guerra, nos conduziu até aqui resultou da constatação de que a velha Europa tinha perdido a liderança do Mundo, que estava a perder as fontes de matérias primas, e que lhe restava, no futuro, o papel de uma vaga liderança cultural. Nos anos prósperos dos últimos 50 anos o caminho parecia seguro e prometia conduzir-nos ao nosso paraíso. A liberalização do comércio, a euforia de um modelo de desenvolvimento baseado na abundância, e impulsionado por intermináveis obras públicas, as apostas no turismo e os investimentos na formação pareciam ser a receita certa, e julgada perene.

O Estado Social, o conforto, a sociedade de serviços, vieram entorpecer a nobre gente do Ocidente que um dia alumiou o caminho da Civilização. Com as necessidades satisfeitas, diminuiu-se a criatividade, embotou-se o engenho. As pessoas começaram a produzir menos e a consumir mais, a viver mais tempo, não à custa do exercício físico, mas devido a melhoria da ciência médica. As crianças foram elevadas à condição de bem primeiro, começaram a escassear, e foram sendo desarmadas das suas defesas naturais, preparadas para usufruir e não para conquistar, educadas para o prazer e não para o esforço, saciadas das gorduras que entorpecem, a começar pela televisão e pelos jogos de computador.

Mário Soares vem-nos dizer, agora, que o BCE deve imprimir mais dinheiro, e faz-me pena ver um político que tem história e ajudou a fazer a história, advogar estes tratamentos paliativos, quando o mal já não se compadece com isso. Imprimir mais dinheiro é matar a economia, é querer mais do mesmo, é tratar o doente que já não se mexe de tão gordo, dando-lhe mais comida, em vez de o por a fazer exercício. No contexto atual, e pensando no sofrimento que nos espera, a espiral descendente desse sofrimento provocado pela inflação (que seria a consequência imediata do aumento da moeda em circulação, sem contrapartida na criação de riqueza) é mais dolorosa do que a espiral descendente da austeridade.

Eu acredito que a Europa não vai ser desconstruída e que a Grécia continuará no Euro. Mas isso obrigará a reconstruir a Europa noutros moldes, a mudar muitas das regras, a condicionar a democracia, e a restringir a soberania das nações que a compõem. Julgo que não será um processo fácil e que não conviverá bem com a demagogia de certos políticos. A alternativa a isto não será pacífica, possivelmente conduzirá a uma escalada de conflitos sociais. Começa a haver demasiada gente que tem a pouco a perder com o agudizar dos conflitos

A Civilização atual foi buscar muitos dos seus valores à Grécia Antiga. É uma curiosa coincidência que seja exatamente na Grécia que se desenvolvem os abcessos que ameaçam o seu futuro.


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