terça-feira, 29 de agosto de 2017

Uma Utopia: Colonizar o espaço

O que é uma utopia? É um acontecimento, um lugar ou um tempo imaginado, ideal ou fantasiado, onde tudo acontece segundo os nosso desejos. A sociedade perfeita que todos desejamos, e que, de um modo geral, os políticos defendem -  pacífica, ordeira, livre, igualitária, democrática e justa - é uma utopia. Não creio que tal sociedade exista ou, algum dia, venha a existir, mas ela foi e continua a ser uma aspiração dos homens de todos os tempos. Mas existem outras utopias que  proliferam - nos documentários, nas notícias, nas teses - que alimentam o imaginário da humanidade. A crença de que o destino do homem é chegar a outros planetas e colonizar o universo é uma utopia.

Foi há poucos semanas que uma notícia dava conta de uma controversa afirmação do conhecido físico Stephan Hawking: se nos próximos cem anos o Homem não for capaz de colonizar outros planetas, então existe o risco da Humanidade sucumbir perante a ameaça do esgotamento dos recursos e das perturbações dos equilíbrios responsáveis pelas alterações climáticas. Eu confesso que não esperava estas palavras - que, em boa verdade, não são recentes, pois já as tinha lido anteriormente -  dum homem de quem se esperaria uma posição mais esclarecida sobre a capacidade de concretizar esse sonho, ou essa utopia, se preferirem. Ou quererá Stephan Hawking, ao dizer isto, simplesmente alertar-nos para a inevitabilidade do colapso civilizacional?

A crença de que um dia - não muito longínquo - o homem colonizará outros planetas fora do sistema solar está muito generalizada e enraizada na opinião pública. É alimentada por notícias que dão conta de que todos os dias se estão a descobrir novos planetas que podem reunir condições necessárias à vida dos humanos. Mas são muitas as condições, entre outras, a  existência de uma atmosfera com presença de oxigénio, uma faixa de temperaturas que permita a existência de água no estado liquido, uma textura rochosa, um tamanho que determine uma força de gravidade suportável ao ser humano, a existência de um escudo protetor de radiações cósmicas letais ou até a existência de satélites (como é o caso da Lua) com funções estabilizadoras.

No entanto, a maior barreira à colonização de outros planetas prende-se com a distância a vencer para os atingir. Estamos a falar de distâncias que obrigariam, no mínimo a viagens de milhares de anos à velocidade das naves atuais. A nave Voyager 1 demorou 30 anos a deixar o sistema solar e, se conseguir manter-se em viagem, demorará mais de 16 000 anos a atingir a distância até à estrela mais próxima de nós, onde não sabemos se existem planetas com condições de habitabilidade. Mesmo com um futuro sistema de propulsão muito mais eficiente seriam sempre necessários séculos para fazer a viagem. Uma nave tripulada, a viajar fora do sistema solar, perderia o contacto com a Terra e ficaria entregue a si própria e não se vê como seria possível manter a funcionar os suportes da vida dos seus tripulantes (eventualmente com funções orgânicas reduzidas ao mínimo) humanos. Além disso, teria de ser alimentada com energia nuclear por perder rapidamente a capacidade de absorver radiações de fontes estelares, nomeadamente do Sol. Tenho por certo que nunca estes viajantes, ou os seus descendentes, voltariam para contar a história.

A colonização de outros planetas fora do sistema solar não está, pois, ao alcance da espécie humana. É uma Utopia, uma crença ao lado da realidade ou um acontecimento que não existe. E, acredito eu, Marte, um planeta do sistema solar, também não será colonizado por evidente inviabilidade económica de tal projeto. Muito mais fácil e mais barato do que colonizar Marte seria colonizar o deserto do Sahara, coisa que não vejo ninguém propor-se fazer. Alimentar as utopias faz parte de uma necessidade dos homens alimentarem os seus sonhos de atingir a eternidade.

A predição de Hawking é, pois, um aviso sério e pertinente de quem sabe do que fala, mas baseia-se numa impossibilidade. Qualquer lugar habitável no espaço da nossa galáxia está a centenas ou milhares de anos de viagem, e o homem nunca poderá empreender tal viagem. O homem está aprisionado no seu sistema solar, e não se irá libertar dele. Como Prometeu agrilhoado nas suas correntes, por castigo dos deuses, também nós roubámos o fogo sagrado da sabedoria que nos deu acesso aos segredos da criação. E o nosso castigo é este de perceber esses segredos sem os poder alcançar e alterar, nem descortinar o seu sentido... E, tal como acontecia a Prometeu na tragédia grega, em cada novo dia, a águia há-de vir comer mais um pedaço do nosso fígado, para nos lembrar que somos mortais.

3 comentários:

  1. Eu vejo a espécie humana, acima de tudo, como um animal… Portanto não vejo nenhum problema no empreendimento humano em perseguir o que considera validos: “A sociedade perfeita que todos desejamos, e que, de um modo geral, os políticos defendem - pacífica, ordeira, livre, igualitária, democrática e justa - é uma utopia. Não creio que tal sociedade exista ou, algum dia, venha a existir, mas ela foi e continua a ser uma aspiração dos homens de todos os tempos.”
    Relativamente à frase anterior, penso que todos os animais procuram optimizar a sua condição em relação ao meio e de acordo com as suas possibilidades! O homem não é diferente… Mesmo o caso do suicídio é uma fuga à dor que o homem (tal como as baleias), na sua complexidade vislumbrou, tomando-o como um ponto de fuga. No entanto, devido a hegemonia da espécie humana, em relação às circunstantes, proliferou na terra de forma desmesurada e agora está na petição de “consumir” mais planetas; não só por questões de sobrevivência mas de conforto material, conforto esse que se pode traduzir, tanto no fabrico de sofás tecnologicamente avançados, como na possibilidade de adquirir recursos que cheguem para satisfazer, desde as necessidades mais básicas, às mais gananciosas e fúteis.
    Há quem diga que este comportamento humano, de um ponto de vista teológico, seja “merecedor de uma lição”… Lição essa, que estaria ao nível de um apocalipse. Eu não creio que a humanidade seja merecedora de uma "liçao". Da mesma forma que um Leao não merece uma lição por atacar um ser humano. Se realmente existir essa ideia de origem metafisica do "Bem perfeito" e se a condição para se poder atingir esse estado depender da inteligência para o atingir, nada indica que a nossa inteligência já tenha atingido o estado superlativo genético (se é que é possível atingir esse grau de escala potencialmente infinita) e que fomos responsáveis pelo estado a que chegamos. No fundo, tal como os outros animais, somos vítimas das limitações circunstâncias da nossa natureza que nos levaram até aqui. Acha que se fossemos bem comportados (ou seja se fizéssemos uma gestão da nossa conduta de forma a viver em harmonia com o planeta) durávamos eternamente? Não haveria sempre o risco de um asteróide colidir? Ou mesmo o próprio sol, daqui a um tempo remoto, aquando do fim da sua vida, trataria de compensar o nosso "bom comportamento" com a extinção?
    Aqui tenho que discordar: “A crença de que o destino do homem é chegar a outros planetas e colonizar o universo é uma utopia.” Esta sua frase é marcada por uma série de premissas cujo significado pode ser contestado. De resto, as barreiras que enuncia são pertinentes e não vale a pena discutir, pois a ciência muito tem que descobrir para chegar a tal ponto.
    Relativamente à frase, podemos começar pelo conceito que merece a minha atenção: “Destino”(no sentido de “direcção”). Destino implica que exista uma meta a atingir. Que meta é essa? Será somente a morte da civilização? Será colonizar outros planetas? Será antes, independentemente da conjectura que estrutura a civilização, moldar a humanidade no sentido de fazer com que a espécie humana fique em harmonia com o planeta?
    Para tentar responder a estas questões, temo que seja necessário identificar e anular todos os juízos de valor, que naturalmente fazemos, devido às nossas paixões e até mesmo a toda a estrutura perceptiva de que dispomos com a função de nos guiar durante a vida. Nesta meditação teremos de atribuir o valor em si de forma fundamentada. Não se pode cair no erro de, por exemplo, dizer que é o Homem que vai chegar a outros planetas: Levando a questão ao absurdo: da hipótese do homem colonizar outro planeta daqui a 500 milhões de anos; quão diferente será o homem entretanto? Será que o homem nessa altura não se terá ramificado em duas espécies distintas (em que a própria fisionomia é distinta)? Onde está o homem então?

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  2. De forma a se poder dar o devido valor semântico às coisas (inclusivamente ao próprio “Valor”) temos de ser exactos na relevância das próprias premissas que vão erigir o nosso pensamento. E com um olhar distanciado apoiar-nos na logica inerente à cosmovisão Darwinista. Comecemos então pelo desvendar do próprio valor, ou seja, encontrar uma base solida daquilo que se pode considerar como sendo o objectivo a atingir pela humanidade em Geral e principalmente pelo individuo em particular:
    Como individuo, estou equipado com um sistema biológico, que é uma instância de milhões de anos de evolução, num empreendimento eterno de optimizar a as formas de vida às condições infinitamente complexas do ambiente, (de que a própria genética participa), e que é resultado da própria evolução física.
    A faculdade que me parece mais adequada para descrever tal causa que guia a própria evolução é a atribuição de “Valor” por si mesmo e em si mesmo. Com isto quero dizer que a evolução está ela própria na “postura” pragmática de “avaliar”, ou seja dar valor, às suas criações de uma forma bastante intuitiva: A capacidade de se multiplicar durante um determinado tempo “t” antes de se extinguir. Isto, claro está, independentemente da forma do ser: Que pode ir desde o sistema celular que evoluiu até participar no meu ser e que se tem de reproduzir, ou reproduzir-se renovando seus próprios constituintes, até eu próprio como um todo. Assim é atribuição de valor para si (evolução) própria. Quanto ao valor em si mesmo é também bastante intuitivo: É a faculdade que cada ser tem em representar uma “avaliação” do ambiente, a cada instante. Claro está, que esta função é ela própria presidida pela essência da evolução, ou sela, ela própria é resultado da evolução. Assim é considerada uma representação eficaz, tudo o que contribui para maximizar o tempo de vida dum sujeito, seguindo-se naturalmente, uma maior probabilidade das circunstâncias permitirem a reprodução desse mesmo sujeito perpetuando assim a sua forma genética (em que esta incluído a da sua própria espécie).
    Dito isto, não vale a pena entrar em detalhes da forma da própria representação em si, cuja função é meramente instrumental para avaliar o ambiente. Alias, seria até um poço sem fundo! Pois no que toca à representação ela é um fenómeno privado e de complexidade coessencial à complexidade da questão da natureza da consciência. Interessa sim, entender que, de forma conceptual, consiste numa avaliação em grau que tem um domínio representacional qualitativo e subjectivo privado: Pode ir desde o entusiasmo sentido a assistir a um filme de terror, passando pelo amor sentido por um filho (cuja felicidade está directamente relacionada com a nossa), até ao sistema químico que esta implícito na direcção do crescimento das raízes das arvores na optimização da obtenção de agua e nutrientes e que permite uma representação ininteligível; não só por ser de uma espécie diferente, mas por bastar ser um Ser diferente.
    Posto isto é valido definir “valor” como função biológica na interpretação topológica, tanto do ambiente, como do próprio organismo, exceptuando apenas, a própria forma do sistema de valorização em si: Afinal, tal como a mão, paradoxalmente, não se consegue agarrar a si própria, um louco, no momento da sua loucura, não sabe que o é.

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  3. Toda a complexidade bilogia inerente á função de valor é de uma complexidade potencialmente infinita – Pois muitos seres existiram, estão em tempo de existir, e muitos mais vão existir, se não neste, noutro planeta. Para além disso no seu tempo de existência, toda esta equação existencial, que define o valor é temporalmente instanciável e instanciada pelas circunstancias ambientais. Assim este “valor” é a bussola da vida e do próprio pensamento que a acompanha, e que permite à vida, navegar através dos tempos, seleccionando as mais variadas formas biológicas neste oceano metafisico. Digo metafisico, pois acaba por ser indiferente se a representação que se faz do mundo é eficaz; apenas sei que tenho um aparato mental que me dá uma representação do mundo e que é uma reminiscência de “testes empíricos” executados pela evolução no “laboratório da vida” onde se testa a capacidade de adaptação de formas de vida. Assim é válida a observação que se faz da vida humana, tanto na forma individual do Eu como na sua função instrumental de sobrevivência da espécie humana como comunidade. Afinal de contas, segundo os Antropólogos, os nossos antepassados filogénicos tiveram uma vantagem evolutiva no momento em que nos tronamos seres socias. Portanto não estranho a nossa faculdade da empatia que evoluiu no sentido de aguçar o valor das relações humanas na forma de laços afectivos, e que, hoje em dia, tem o seu expoente máximo na formalização do contrato social. Isto claro, em constante projecto de aperfeiçoamento: Não há muito tempo lutávamos por comida, apos atingirmos um estado hegemónico, só se luta por poder (sem perceber que a fome de poder tem um função oculta fundamental que no fim serve a dimensão reprodutiva, da mesma forma que o pavão tem cores nas penas). E para atingir usa todas as manhas e artimanhas tornando-o ainda mais animal, pois até a mentira é uma “ideia” roubada á natureza: Ates de desenvolvermos a fala, já nos camuflávamos como os camaleões, para caçar. A mentira é somente mais um exemplo de iteração da natureza em potência.
    O poder pode ser desde o comando de pessoas até ver o dinheiro da conta a crescer exponencialmente, sendo este ultimo o fenómeno que denuncia a forma mais pura do mesmo, pois é quando o poder se alimenta de poder em potencialidade (dinheiro que dá poder de compra e estatuto) que funciona em Loop de forma cega. Como um computador a funcionar com dados redundantes que entra em loop paradoxal, queimando-o por sobreaquecimento. Por mais que isto seja desnecessário, o “querer mais” é uma função importante que existe e que, numa perspectiva evolutiva não podia deixar de ser promovida: Desde o leão que vagueia a aumentar o território, até aos Reis que expandiam o território, dominando-o e ao mesmo tempo construindo fronteiras de tensão e divisão. Segue-se que quanto maior for a extensão do nosso domínio maior é a probabilidade de sobrevivência e reprodução. Curiosamente é essa divisão que por um lado mantem a pluralidade cultural e por outro perpetua a desigualdade entre nações.

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