No último "Prós e Contras" da RTP, Medina Carreira falou das causas da crise. E culpou a globalização pela dramática situação económica de Portugal, da Europa e dos Estados Unidos. Apresentou números, nomeadamente comparou o crescimento da última década do século XX com a primeira década do século XXI, em que o valor médio das taxas de crescimento generalizado das economias "ocidentais" caiu para cerca de metade. Associada à globalização, Medina Carreira falou da desindustrialização desta zona, cuja capacidade produtiva se transferiu para a China e para outros países. Referiu, a propósito, que em Portugal o sector industrial representava, em 1974, 29% do PIB e que, em 2011, essa percentagem não ultrapassava os 12% . E, no elencar das causas da crise, esqueceu-se de referir, com já tem feito noutras ocasiões, o forte aumento do valor da fatura energética nas despesas desses países, talvez a causa mãe de todos os males que nos afligem.
Mas afinal o que é a globalização? Poder-se-ia ter evitado? A globalização é consequência natural da aplicação dos princípios do liberalismo económico, entre os quais a livre concorrência, a livre circulação de capitais e os acordos do comércio livre, princípios que, desde Adam Smith, formataram o mundo e a sua economia. Foram eles que impulsionaram o crescimento da economia mundial, e que aceleraram o desenvolvimento dos países emergentes. Foi o caso da China, aquele que pela sua dimensão, tem um maior impacto na economia mundial. Numa primeira fase, a globalização poderá ter sido boa para a Europa, pois permitiu baixar o preço de produtos manufaturados e exportar tecnologia. Mas agora já percebemos o logro, e interrogamo-nos se teria havido outro caminho, e se ainda será possível retroceder?
Este sistema económico reage mal a
condicionamentos e protecionismos. O crescimento exige que a produção e
o capital se desloquem para as zonas ou países que lhe são mais favoráveis. Dito por outras palavras, o
capitalismo é cego e está sujeito a uma lei de atração que ignora a
moral, é indiferente às desigualdades e ao sofrimento humano, acredita na abundância ilimitada de recursos, desconhece a poluição e os riscos ambientais. É regido por uma espécie de "lei da gravidade" que impele a
economia para os excessos que nós conhecemos, sempre em busca do
crescimento e do lucro. Mas, convenhamos, a nível global, a globalização teve um efeito positivo sobre o crescimento.
Mas a economia enfrenta limites críticos, são limites exógenos que o sistema desconhece. A exigência do crescimento está a criar uma forte pressão demográfica, e um desequilibro resultante da escassez de recursos e do efeito dos efluentes produzidos. Ora, isso vai obrigar a estabelecer condicionalismos no controlo demográfico, na repartição e utilização dos recursos, e no controlo das emissões de alta entropia, que são, afinal, os
inputs e os
outputs do nosso sistema. É isso é um paradoxo na medida em que não pode ser resolvido
por dentro, mas que também não pode ser resolvido
por fora, sem destruir a própria essência do sistema, o qual não aceita interferências.
Na base do conceito de Transição está a exigência de uma economia que ultrapasse esse paradoxo. Terá de ser uma economia de
crescimento zero, mas que conduza, mesmo assim, a uma prosperidade, logicamente menos materializada. Vai obrigar a um governo mundial que imponha uma melhor repartição e uma mais sábia utilização dos recursos existentes, e que estabeleça regras para evitar os efeitos perniciosos dos efluentes sobre o ambiente e sobre o clima.
Num tal cenário, vão colocar-se delicadas questões de natureza moral e ética quando for necessário sacrificar o interesse individual em beneficio do interesse coletivo. O formato de uma tal nova economia é ainda muito difuso, mas é evidente que haverá fortes implicações no sistema financeiro, no sistema politico, e nos princípios que estão na base das chamadas democracias ocidentais, assentes nos partidos políticos. Os nossos governantes que falam e insistem no crescimento e na retoma (afinal quem não fala?), ainda não perceberam o paradoxo em que vivemos. E estão a conduzir-nos para lado nenhum...
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